Cresce potencial de consumo dos idosos

Os consumidores com mais de 60 anos devem movimentar neste ano R$ 400 bilhões. O valor, equivalente ao PIB da Irlanda, é 45% maior do que há cinco anos. Varejo dá pouco atenção para a terceira idade e precisa se preparar para atender demanda, dizem especialistas. 

São 22,3 milhões de pessoas, das quais 5,4 milhões ainda estão no mercado de trabalho, com ou sem carteira assinada. Apesar desse potencial de consumo, o varejo ainda dá pouca atenção à chamada terceira idade.
“Só recentemente o comércio começou a se preocupar de fato com hábitos e costumes desse consumidor e a treinar seus funcionários para atender esse pessoal”, diz Gilberto Cavicchioli, professor do Núcleo de Gestão de Pessoas da ESPM.
Sete em cada dez aposentados têm renda mensal garantida pela Previdência Social. Ou seja 73,5% dos rendimentos desses consumidores mais velhos (ou R$ 295,6 bilhões) vêm de aposentadorias e pensões concedidas pelo INSS. Somente 20% da renda deles depende da relação com o mercado de trabalho.

Os dados foram compilados -a partir de informações da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) e do Censo 2010- pelo instituto Data Popular, especializado no setor de baixa renda.
“Para conquistar um consumidor com experiência e dinheiro no bolso, o varejo precisa investir em serviços”, diz Renato Meirelles, diretor e sócio do Data Popular.

“A redução acelerada da taxa de natalidade e o aumento significativo da expectativa de vida, associados à migração de consumidores das classes D e E para outras, mudam a dinâmica do consumo. As famílias gastam mais e melhor e o varejo tem de se preparar para atender essa demanda”, diz Antonio Carlos Borges, diretor-executivo da Fecomercio SP.

PELA INTERNET

Quando decidiu montar sua loja virtual do Magazine Luiza, no Facebook, a enfermeira aposentada Sueli Monteiro Carvalho, 55, não imaginou quem faria parte de sua “carteira” de clientes.

Com a ajuda dela, um seleto grupo de senhoras, de 70 anos para cima, decidiu fazer compras pela primeira vez pela internet. “Começou com minha mãe, de 80 anos. Ela ficou feliz quando o produto foi entregue em sua casa, em seu nome.”
Depois vieram primas, tias e até a sogra pedir ajuda de Sueli para comprar produtos vendidos pela rede social.
Já as amigas Elza Pires Paes Gonçalves, 65, e Wanda José Vieira, 67, preferem as compras no mundo real.
“Sou louca por ouro. Tenho umas 200 peças, entre brincos, anéis e correntes. Sempre que preciso de um reforço no orçamento recorro ao penhor e depois recupero minhas joias”, diz a professora aposentada Wanda.

Os cinco cartões de crédito, os empréstimos consignados e os bicos vendendo doces e salgados já a levaram a vários cantos em viagens e excursões.
“Também me ajudaram a comprar um notebook.”
Elza, coordenadora de um centro de convivência para a terceira idade, prefere as bolsas, os sapatos e as viagens de navio. “Mas até piquei o cartão de crédito para não ficar endividada.”

Renda da 3ª idade é maior que os gastos

Com mais dinheiro, idosos aumentam compra de produtos considerados não básicos, como adoçante e requeijão
O reflexo da mudança no consumo já pode ser visto na cesta dos consumidores da terceira idade. O gasto com produtos considerados não básicos aumentou 7% em seis anos, de acordo com pesquisa da consultoria Kantar Worldpanel, especializada em consumo domiciliar.

Adoçante, detergente líquido para roupa, tintura para cabelos, sopa semipronta, bebidas à base de soja e requeijão são alguns dos itens que entraram na casa dos consumidores mais velhos.
São também as donas de casa mais idosas as que conseguem maior equilíbrio no orçamento familiar.
“Na faixa a partir dos 60 anos, constatamos que a renda média está 7% acima do gasto médio mensal. Nas demais faixas etárias, o gasto se equipara à renda ou está acima do rendimento” diz Christine Pereira, diretora comercial da Kantar Wordpanel.
Com as cifras que esses consumidores movimentam em mente, a rede Magazine Luiza faz promoções específicas ao menos três vezes ao ano: o Dia do Aposentado.

Dos 6 milhões de clientes da rede, 13% têm 60 anos ou mais. São quase um quarto dos chamados “clientes Ouro” -aqueles que fazem cinco compras ao ano e cujos gastos somados chegam a R$ 2.000, no mínimo.
“Há uma mudança de comportamento nesse consumidor, que hoje já tem uma convivência mais amigável com celular, com computadores. Há cinco ou seis anos essa proximidade com a era da informática era impensável nessa faixa etária”, diz Rogério Bruxellas, diretor de marketing do Magazine Luiza.

Oito em cada dez brasileiros dessa faixa de renda costumam comprar produtos em promoção e 65% preferem pagar em dinheiro, segundo pesquisa do Ibevar (Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo) com 500 paulistanos.

 

CARTÃO DE LOJA

Para Claudio Felisoni, presidente do Ibevar, para conquistar esse público, o varejo deveria incentivar o uso de cartão da loja (cartão fidelidade), uma vez que 65% dos pesquisados entendem que ser fiel é vantajoso.
“Os mais velhos são conservadores com relação a marcas e locais de compra. Conquistar esse público não é fácil, por outro lado é garantia de clientela fiel”, diz Renato Meirelles, do Data Popular.

O comércio também deveria facilitar o acesso a informações sobre produtos, porque 6 em cada 10 desses consumidores fazem suas compras sozinhos, diz ele.
“Organizar promoções para esses consumidores aos finais de semana para estimular as compras também aos sábados e domingos é outra iniciativa que o varejo deve estar atento”, diz Felisoni.

“Nos Estados Unidos, o tratamento específico para esses consumidores é muito maior. Hotéis, companhias aéreas, parques de lazer investem em ações para os seniores porque sabem que esse público tem mais tempo para atividades”, diz o professor Juracy Parente, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV e professor visitante da Universidade da Flórida.
Lojas não sabem aproveitar o potencial de consumo de idosos
No Censo de 2010, a participação das pessoas com mais de 65 anos de idade na população atingiu 7,4%. Isso representa mais de 14 milhões de pessoas.

Além de numeroso, esse grupo representa um grande potencial de vendas para o varejo e empresas em geral. Afinal, eles já passaram pelas maiores despesas da vida: educaram os filhos e construíram e mobiliaram a casa onde vivem.
A renda agora é para alimentação, saúde e lazer e para continuar agradando aos familiares.
Como entender e atender esses consumidores? O primeiro ponto importante é que eles não se sentem velhos.
A pior coisa que uma empresa pode fazer é usar eufemismos como “melhor idade” para se comunicar com eles. Melhor idade é quando eu tinha 20 e poucos anos, muitos vão dizer.
Mesmo assim, o estereótipo da velhinha de cabelos brancos usando bengala é absolutamente rejeitado por eles -e com toda a razão.
Hoje em dia, pessoas perto dos 70 anos não têm cara de velhinha de bengala! Afinal, foram culturalmente ativos e pioneiros: viram o homem pisar na Lua, viveram como hippies, atuaram na liberação feminina, viveram o regime militar, a revolução sexual, a revolução da informática e da internet, entre tantas outras modificações. Para eles, a idade é um estado de espírito, e não um número.

Uma outra diferença fundamental nesse grupo são suas motivações pessoais. Entre os 20 anos e os 40 anos, as pessoas sentem-se imortais. O esforço pessoal é focado em ser alguém e a sensação geral. Acredita-se que é possível moldar o mundo às nossas necessidades.
Depois dos 40 anos, percebe-se que a realidade não é tão boa assim e as pessoas iniciam uma busca por significado na vida que se estende até seus últimos dias.
De maneira geral, até os 40 o foco é no “ser social”. Depois dessa idade, o foco passa a ser o “eu interior”.
Produtos e serviços que satisfaçam essa necessidade têm mais chances junto a esse público.

Mas será que nossas lojas sabem atender esses consumidores?
Não. Um ponto fundamental que elas esquecem é que, independentemente da mentalidade jovem, a idade cobra fisicamente seu preço e as lojas não estão preparadas para isso.

Consumidores mais velhos sentem desconforto em ambientes com excesso de estímulos, sua visão perde a capacidade de discernir cores (sem falar nas letras pequenas), sua agilidade e flexibilidade para manusear objetos ficam reduzidas, além de terem uma tendência a sofrer mais com a obesidade.
É patente que as lojas e os produtos não são desenhados para ajudá-los a superar essas dificuldades.

No quesito atendimento, os mais velhos odeiam ser um número. Querem tratamento diferenciado, personalizado, alguém treinado para ouvi-los e que os trate como indivíduos, coisas cada vez mais raras no varejo de hoje.
Além disso, não valorizam lojas, produtos e marcas pelo prestígio social que trazem. Querem algo autêntico, que os ajude a ser alguém. Hoje, poucas marcas podem pleitear esse lugar no mercado.

Em poucas palavras, o potencial dos consumidores mais velhos é grande, mas quase ninguém está preparado para atendê-los.

 

Fonte – Folha de S.Paulo