O Conselho Federal de Medicina estabelece, por intermédio da Resolução 1995/2012, a validade do testamento vital em casos terminais. A normativa determina que o médico deve respeitar a vontade do paciente, sobre como e se deseja ser tratado no limite da morte.
Marco social histórico, a orientação do CFM refletia então e ainda reflete mudanças comportamentais e de cultura no Brasil. Felizmente, o arcabouço ético da medicina evoluiu demais nos últimos anos: sinal de modernidade e a valorização dos princípios humanitários.
Na prática, já há muito mais tempo os médicos atendem à vontade de pacientes, deixando de sustentar a vida com recursos artificiais quando já não existe esperança de cura nem de uma sobrevida digna.
Manter alguém em estado vegetativo por meio de tubos, fios, sondas, sem esperança de retorno, beira a crueldade.
Não falo de eutanásia, já que apressar o fim de quem quer morrer, além de crime, abre perigosos precedentes. Um exemplo é o programa eutanásico nazista, que conduziu à deliberada e sistemática eliminação de milhares de seres humanos.
Discorro, sim, sobre a decisão pautada no direito fundamental ao óbito digno. A ortotanásia segue o preceito de morte na hora certa, “orto” certo, “thanatos” morte. Compreende o não prolongamento artificial à vida, possibilitando ao paciente em estado terminal e irreversível morrer sem ter sua dor perpetuada por aparelhos que arrastam suas funções vitais.
Aliás, desde 2006, o Conselho permite aos profissionais de medicina a ortotanásia, por intermédio da Resolução 1805. Entretanto, sempre houve obstáculos por parte de membros do Ministério Público.
É fundamental, portanto, que a sociedade receba informações e tenha compreensão do que é lícito ou não. Nos casos de ortotanásia há conduta é plenamente resguardada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Quando o óbito é compreendido como um processo natural e final da vida, a ortotanásia é sinal de respeito à morte digna, o que possibilita a humanização do processo.
Se todo o processo da vida deve ser alicerçado no respeito à dignidade, não há dúvida que o da morte também deve ser guiado pelo respeito ao indivíduo.
A finalidade da intervenção médica na ortotanásia é a preservação da dignidade humana, para que o paciente tenha garantido o direito à morte boa, ao seu tempo e com respeito aos seus valores.
O Código Penal do Brasil data de 1940, sendo que não acompanha o desenvolvimento científico nas várias áreas do conhecimento. O progresso da humanidade pressupõe que os avanços científicos sejam utilizados em defesa dos direitos fundamentais.
Essa é a nossa leitura.
Sobre o autor
Antonio Carlos Lopes é presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica