No Dia Mundial do Diabetes, pacientes denunciam dificuldades no tratamento em PE

Pacientes denunciam falta de insulinas e materiais para o tratamento. Remédios deveriam seriam disponibilizados na Farmácia de Pernambuco

O diabetes é uma doença em que o corpo não produz, ou não utiliza de forma adequada, o hormônio da insulina

Nesta quarta-feira (14) é lembrado o Dia Mundial do Diabetes, doença que afeta 425 milhões de pessoas no mundo. No ranking global, o Brasil fica em quarto lugar, com 13 milhões de pessoas diagnosticadas com essa doença crônica e silenciosa. Enquanto deveriam estar recebendo assistência equivalente à gravidade da enfermidade, pacientes reclamam da falta de insulinas e materiais que deveriam ser disponibilizados pelo Estado de Pernambuco para que o tratamento fosse feito corretamente. Em muitos dos casos, diabéticos precisam arcar com produtos e serviços particulares para evitar agravações no quadro.

“A pior parte de ter diabetes são os trâmites para conseguir a medicação. Precisamos passar por uma avaliação a cada três meses para conseguir a renovação de receita. Mas, como dependo da rede pública, nem sempre tem vaga para as consultas. Por vezes, só consigo marcar consulta para daqui a quatro meses. Sem médico, não consigo o documento e tenho que comprar a insulina com meu dinheiro. As vezes é mais de R$ 400”, conta o taxista Erivaldo Luiz Bezerra, 43 anos. Diabético desde os 9 anos, ele precisa fazer uso contínuo das insulinas Lantus, NovoRapid ou Humalog. Há mais de seis meses ele compra o medicamento em farmácias particulares.

A mãe de Erivaldo também é diabética. Em uma das vezes que o tratamento do taxista foi interrompido por falta de insulina na Farmácia de Pernambuco, no bairro da Boa Vista, área central do Recife, foi preciso que o controle fosse feito com o mesmo medicamento utilizado por sua mãe. “O efeito não era o mesmo, mas infelizmente precisamos nos submeter a isso”, lembra. Segundo ele, a disponibilização está irregular há cerca de 5 anos.

O diabetes é uma doença em que o corpo não produz, ou não utiliza de forma adequada, o hormônio da insulina. “Se caracteriza por uma glicemia alta no sangue, que se deve a uma dificuldade em metabolizar a glicose pela insulina, único hormônio do corpo que é hipoglicemiante, ou seja, é capaz de baixar a glicose”, explica a endocrinologista do Real Hospital Português, Maria Amazonas. Muitas vezes assintomático, está ligado a fatores que influenciam na predisposição. Além das complicações da própria síndrome, tem relação com outras doenças graves e recorrentes em todo o mundo.

Sedentarismo, sobrepeso, falta de alimentação saudável e casos de diabetes em parentes próximos são pontos que podem acarretar a doença. Segundo a endocrinologista Geísa Macedo, presidente da Regional Pernambuco da Sociedade Brasileira de Diabetes e do Instituto Brasileiro de Diabetes (Ibradi), é preciso que a doença seja menos negligenciada. “Vivemos uma epidemia sem controle. No Nordeste a taxa é maior que em outras áreas e está aumentando. A cada minuto, três pernas e pés são amputados”, diz. De acordo com a médica, leis estaduais e federais obrigam que o tratamento seja garantido no sistema público de saúde. “É preciso individualizar os tratamentos, criar centros e Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) específicas. Os pacientes precisam ter mais acesso ao sistema de saúde. O Governo teoricamente dá os medicamentos. Mas, se falta, como os pacientes ficam? Isso não poderia acontecer”, acrescenta a médica.

Falta de materiais

A estudante de psicologia Marília Barros, 19, descobriu o diabetes tipo 1 ainda criança. Durante anos de controle de glicose, o tratamento mudou algumas vezes, mas a dificuldade para conseguir as insulinas e os materiais para o controle continuaram. “A insulina é mais fácil, falta menos. As tiras para fazer o teste de glicemia faz mais de um ano que não recebo. Outras coisas, como a agulha e a lanceta, por exemplo, nunca cheguei a receber. Todo o material tem que ser comprado”, comenta. Nos meses em que falta insulina, os pais da jovem chegam a gastar cerca de R$ 550, sem acrescentar o restante do material, que pode chegar a R$ 400.

Até os 13 anos, a estudante morava em São José da Coroa Grande, no Litoral Sul do Estado. Para conseguir os medicamentos, os pais viajavam ao Recife. No entanto, nem sempre havia insulina para que o tratamento continuasse. Para a renovação da receita, Marília consegue avaliação de médicos do seu plano de saúde, mas, ainda assim, sofre com a burocracia. “Mesmo sabendo que é um medicamento que eu vou usar pelo resto da vida, eles pedem renovação da receita. Caso eu não leve na data determinada, eles não entregam mais naquele mês e corre risco de no mês seguinte não ter. A gente liga para a Farmácia de Pernambuco e dizem que não tem previsão”, relata.

Por sofrer com crises de hipoglicemia noturna, foi indicado que a estudante utilizasse uma bomba de insulina de infusão contínua, que funciona como um pâncreas artificial. O aparelho custa aproximadamente R$ 15 mil. Para a família dela, a opção foi recorrer ao plano de saúde particular. “Foi difícil, mas é a opção mais viável, porque pelo Governo o tempo de espera seria muito maior”.

Complicações

A falta da insulina pode acarretar diversas complicações aos pacientes, seja a curto ou longo prazo. “O diabético começa a urinar muito, e isso pode levar à desidratação. O corpo fica mais vulnerável a infecções de qualquer tipo e, para que isso evolua, é rápido. Muitas pacientes procuram as emergências com mal estar, mas esses sintomas são negligenciados e o quadro pode evoluir. Lesões simples nos pés também são preocupantes, pois o risco de infecção é maior e isso leva a amputação. Somando problemas como hipertensão, que acomete 50% dos diabéticos. O infarto, por exemplo, é a maior causa de morte entre pacientes com diabetes, junto com o acidente vascular cerebral (AVC). Também é a maior causa de insuficiência renal e cegueira em adultos”, explica a endocrinologista Geísa Macedo. Segundo ela, esta é a quarta doença que mais mata no País.

A dificuldade nos medicamentos não é a única queixa das famílias com diabéticos. A artesã Celi Regina Pereira, 50, tem uma filha que sofre com diabetes há quatro anos. Thalita Dias tem 29 anos e é deficiente auditiva. No caso dela, o medidor de glicose oferecido pelo Estado também é ineficaz. “Nós usávamos um glicosímetro que funcionava bem. Por achar caro, o Governo trocou de marca, mas essa segunda não funciona. Eles disponibilizam fitas para esse novo medidor, por isso precisamos comprar para que Thalita use o aparelho antigo, que é mais preciso”. Segundo a artesã, em uma das falhas do novo equipamento, a jovem sofreu convulsões e teve que ser hospitalizada. “A glicose dava alta e nós aplicávamos insulina. Os valores não baixavam e depois de várias doses, ela passou mal com hipoglicemia, mas o aparelho continuava dando valores que não coincidiam com o nível glicêmico dela. Quando reclamamos, o Governo disse, em outras palavras, que nós é que não sabíamos usar”, denuncia.

Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) informa que disponibiliza as insulinas Levemir, Lantus, Apidra, Humalog, Novorapid, NPH e Regular – as duas últimas distribuídas pelo Ministério da Saúde -, distribuídos para 17 mil pacientes cadastrados, que também recebem as tiras medidoras de glicose, lancetas, agulhas e glicosímetros. Pacientes informaram a falta da insulina Lantus atualmente. Quando questionada, a SES diz que recebeu no início desta semana aproximadamente 30 mil canetas preenchidas com esse tipo de medicamento, o que seria suficiente para os próximos meses. Assim como a Humalog, que também está disponível no estoque. Já as insulinas Detemir e Asparte, a Secretaria “informa que a entrega está atrasada pelos fornecedores, que já foram notificados pelo órgão. Outro processo de compra foi iniciado a fim de agilizar a aquisição”. A pasta também informa que um processo de compra está em andamento para a aquisição da insulina tipo glusilina, mas nenhuma empresa apresentou proposta.

AÇÕES DO DIA DO DIABETES

Na Unidade Pública de Atendimento Especializado (UPAE)Deputado Antônio Luiz Filho, no Arruda, Zona Norte do Recife, será realizada uma programação para o Dia Mundial do Diabetes. A partir das 8h15, pacientes e funcionários poderão participar da realização de exames de detecção, palestras e momentos para orientação e retirada de dúvidas.

No shopping RioMar, a Sociedade Brasileira de Diabetes, o Ibradi e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia também estarão realizando uma ação de conscientização. O evento acontece das 13h às 18h, e o público poderá realizar exames de medição de glicemia, medição de cintura para detectar obesidade pélvica – que está relacionada ao diabetes -, além de aferição de pressão arterial. Oftalmologistas também estarão no local realizando exames do fundo do olho, para detectar glaucoma em pacientes já diagnosticados com diabetes.