Governo concede patente do Sofosbuvir e barra genérico mais barato

A empresa farmacêutica norte-americana Gilead obteve decisão favorável relacionada a um pedido de patente do medicamento Sofosbuvir no Brasil. A solicitação foi deferida ontem (18) pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi). O remédio vem revolucionando o tratamento da hepatite C, contribuindo para a cura de muitos pacientes e reduzindo a demanda pelo transplante de fígado.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), através do Instituto Farmanguinhos, anunciou em abril ter firmado parcerias para fabricar uma versão genérica nacional do remédio que seria adotada no Sistema Único de Saúde (SUS). Na ocasião, a expectativa era de que ela estivesse disponível até o final deste ano, ajudando assim a erradicação a hepatite C no país. Porém, com a decisão do Inpi, a Gilead terá exclusividade para a produção do mediamento e monopólio da sua comercialização no Brasil.

Em nota, a Fiocruz afirmou que recebeu com surpresa a notícia do deferimento do pedido de patente e que não houve exposição das justificativas técnicas. A fundação avalia que o pedido não apresenta os requisitos de novidade e atividade inventiva. Também não teria sido apresentada a descrição de invenção de modo que um técnico consiga reproduzir o medicamento reivindicado. Tal descrição é um dos critérios que devem ser observados para a concessão de patente.

 

Repercussão

O Ministério da Saúde informou que, oficialmente, ainda não teve ciência da decisão do Inpi. Pelos cálculos da pasta, o preço de cada tratamento de hepatite C, que dura 84 dias, ficaria em pouco mais de R$ 5 mil usando o medicamento nacional. Comprando o remédio dos laboratórios privados, o custo por paciente já chegou ao patamar de US$ 84 mil.

A organização humanitária Médicos Sem Fronteiras também emitiu nota lamentando a decisão do Inpi e avaliou que ela limita o acesso à cura da hepatite C. Segundo a entidade, há quase 700 mil pessoas com a doença no Brasil e havia argumentos sólidos, baseados no interesse público, para negar a concessão da patente. “Atualmente, a Gilead cobra cerca de US$ 4,2 mil por tratamento contra a doença. Em contraste, nos projetos em 13 países onde trata a doença, a Médicos Sem Fronteiras adquire medicamentos genéricos da mesma qualidade dos remédios de marca ao preço de US$ 120”, registra o texto.

Nos cálculos realizados pela organização humanitária, a adoção da versão nacional do remédio pelo SUS levaria a uma economia superior a R$1 bilhão por ano. Ela defende que o governo federal avance no licenciamento compulsório do Sofosbuvir, permitindo a produção por outras empresas e barateando o remédio.

A Rede Brasileira Pela Integração dos Povos, através do seu Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual, anunciou que vai entrar com recursos contra a patente. A rede é composta por diversas organizações, entre elas a Médicos Sem Fronteiras e a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (Abia).

“Esse é um medicamento que salva vidas e não deve haver um monopólio sobre ele. Não podemos ficar nas mãos da ganância de uma transnacional que irá fixar altos preços. O Inpe fez uma escolha e colocou em risco um projeto de eliminação da hepatite C no Brasil”, disse Pedro Villardi, coordenador do grupo de trabalho.

Em nota, o Inpi informou que deferiu a patente para uma molécula intermediária para a síntese do Sofosbuvir e afirmou que se baseou nos critérios técnicos previstos na Lei da Propriedade Industrial, assim como em todos os demais exames que realiza. O órgão esclarece ainda que cada país tem independência para atender ou não os pedidos e decisões semelhantes em favor da Gilead ocorreram na África do Sul, Colômbia, Estados Unidos, Índia, Japão e Rússia, e ainda no Escritório Europeu de Patentes.

“A Lei prevê que a invenção, para ser patenteada, deve ter novidade (ser nova no mundo todo), atividade inventiva (não ser óbvia para um técnico no assunto) e aplicação industrial (ser passível de fabricação). O parecer definitivo publicado nesta terça-feira foi elaborado após as manifestações de terceiros (13 no total, incluindo empresas, órgãos de governo e entidades da sociedade civil), dois pareceres do Inpi, contra-argumentações e ajustes do solicitante. O processo seguiu todas as etapas e prazos previstos na Lei”, acrescenta a nota. A Agência Brasil também tentou, sem sucesso, contato com a Gilead.

Fonte: EBC – Fiocruz