Nota à imprensa sobre segurança de medicamentos genéricos.
A respeito da matéria “Fantástico testa a qualidade dos genéricos mais vendidos no Brasil”, exibida pelo programa na TV Globo neste domingo (29/01), na qual foram avaliados quinze medicamentos genéricos com os princípios ativos dipirona sódica, losartana potássica e sildenafila, a Anvisa esclarece:
O Centro de Estudos e Desenvolvimento Analítico Farmacêutico (CEDAFAR) da Universidade Federal de Minas Gerais, contratado pela produção do Fantástico para os estudos, nunca foi habilitado pela Anvisa para realizar testes em medicamentos para efeito de análise fiscal. A análise fiscal, que é efetuada em drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, destinada a comprovar a sua conformidade com a fórmula que deu origem ao registro, segue regras definidas pela Agência, garantindo-se sempre a coleta de três conjuntos de amostras do medicamento a ser analisado; a possibilidade de o teste ser acompanhado por um perito indicado pela empresa; e sua realização exclusivamente em laboratório habilitado para esse fim. Esse rigor é necessário para evitar concorrência desleal entre fabricantes, que poderiam encomendar testes em laboratórios não habilitados apenas para gerar dúvidas sobre produtos concorrentes.
O CEDAFAR é habilitado pela Agência, assim como outros laboratórios, apenas para realizar ensaios de equivalência farmacêutica visando o processo de registro de medicamento. Esses testes são, depois de realizados, analisados tecnicamente pela Anvisa, que verifica sua consistência técnica, juntamente com outros parâmetros, e decide pela concessão do registro. O CEDAFAR já teve sua habilitação para realizar esses testes suspensa pela Agência em duas ocasiões, a última delas no período de 12/09/2015 até 03/02/2016, pois nenhum de seus equipamentos, na inspeção realizada pela Anvisa, estava calibrado de acordo com as normas vigentes. A informação de que o CEDAFAR não é habilitado para realizar testes de análise fiscal foi repassada à reportagem, mas foi sonegada pelo Fantástico aos seus espectadores, dando a falsa impressão de que o laboratório é credenciado para todos os tipos de testes.
Causou espanto, também, a alegação dada pela reportagem de que o teste de bioequivalência dos medicamentos, que é, em todo o mundo, o teste mais importante e conclusivo para definir se um genérico é realmente equivalente ao medicamento de referência, não foi realizado por “questões éticas”. Isso não é verdade. Não haveria nenhum impeditivo ético para que esses testes fossem realizados, desde que cumpridas as normativas éticas vigentes de serem submetidos e aprovados por um Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) credenciado no Comitê Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) do Conselho Nacional de Saúde/MS. Pelo contrário, uma vez realizados tais testes, eles poderiam fornecer uma informação conclusiva.
Testes de bioequivalência são realizados em voluntários sadios e medem a concentração do produto no sangue, possibilitando, sem nenhuma dúvida, a avaliação definitiva sobre a ação real do medicamento no organismo humano. Os testes que foram realizados pelo laboratório contratado pelo Fantástico – de teor e de dissolução do princípio ativo – são importantes, mas não suficientes. Ou seja, não são capazes de assegurar a equivalência farmacêutica dos medicamentos genéricos com os medicamentos de referência, o que é feito pelo teste de bioequivalência, que não foi realizado para a reportagem.
Essa regra de tomar o teste de bioequivalência como o definitivo para avaliar os medicamentos genéricos é utilizada pela Anvisa, assim como pelas agências de medicamentos dos Estados Unidos, Canadá e Japão e países da Europa, entre outros.
Porém, ainda que o Fantástico tenha exibido resultados de testes realizados sem o cumprimento dos requerimentos técnicos e regulatórios para uma análise apropriada, a Anvisa analisou os resultados, enviados pelo CEDAFAR, e informa que:
1 – Todos os lotes de medicamentos com os princípios ativos sildenafila (duas amostras) e losartana potássica (oito amostras) estavam em condições sanitárias satisfatórias, ou seja, dentro dos padrões esperados. Os próprios laudos informaram que os lotes dos medicamentos testados são equivalentes aos medicamentos de referência. Esses resultados coincidem com os testes semelhantes que os produtores são obrigados a apresentar para solicitar o pedido de registro e que são, criteriosamente, analisados pela Agência antes de conceder o registro;
2 – Quatro das cinco amostras de dipirona sódica testadas estavam em condições sanitárias satisfatórias;
3 – O lote b16d1090 de dipirona sódica solução oral 500 mg/ml, da empresa Brainfarma, apresentou resultado aparentemente insatisfatório em relação ao teste de teor. A concentração média de dipirona encontrada foi de 92,87%, valor inferior ao estabelecido como referência, que é de 95,00%. Apesar dos exames realizados por contratação do programa Fantástico não terem validade legal, a Anvisa, cumprindo sua missão de proteger a saúde da população e como o faz com qualquer denúncia sobre irregularidades em medicamentos, já iniciou os procedimentos para apurar se, nesse lote específico, existe mesmo teor inferior ao que é obrigatório. A Agência notificou a Brainfarma a prestar informações quanto ao lote analisado. Além disso, está em curso a coleta de análise fiscal do referido produto. Esses procedimentos têm regras bem definidas para que os resultados não deixem qualquer dúvida sobre sua interpretação. Serão coletadas três grupos de amostras (prova, contraprova e testemunho) e os exames serão realizados em laboratório oficial. Vale ressaltar que, em 2014, a Brainfarma, por ocasião de renovação do registro deste medicamento, apresentou à Anvisa estudo de equivalência farmacêutica, realizado por laboratório credenciado pela Agência, que concluiu pela equivalência farmacêutica da dipirona sódica. O laudo apresentado pela empresa, na ocasião, obteve resultado de teor de 104,19%. Os testes que ora a Anvisa está determinando a realização dirimirão qualquer dúvida e permitirão o esclarecimento se esse lote do medicamento se encontra regularmente dentro dos parâmetros exigidos;
4 – Sobre possível irregularidade em um lote do medicamento losartana potássica, comprimido 50 mg, da empresa EMS S/A, é preciso esclarecer que a metodologia utilizada pelo CEDAFAR foi diferente da que está autorizada e considerada como de referência pela Anvisa para testar a equivalência farmacêutica nesse medicamento. O teor médio encontrado de losartana potássica 50mg, da empresa em questão, foi de 94,82%, valor superior ao estabelecido como referência em seu registro vigente, que é de 90,00%. Utilizar metodologia diferente significa que não é possível comparar os resultados obtidos com aqueles que deveriam ser apresentados pelo produto, não havendo base técnica e científica para considerar que pode haver irregularidades;
5 – Sobre os resultados dos testes dos perfis de dissolução dos lotes de losartana das empresas Medley, Geolab e Pratti, a Anvisa esclarece que a comparabilidade de perfil de dissolução entre o medicamento genérico e o medicamento de referência não é conclusivo para registro ou comercialização de medicamento genérico no Brasil, bem como estabelece as principais agências regulatórias do mundo;
5.1 – Na matéria do Fantástico, os especialistas que foram ouvidos não diferenciaram “dissolução” e “perfil de dissolução”, confundindo os dois conceitos. Não sabemos se por falha na edição ou por não saberem exatamente que teste havia sido realizado. Dissolução é um ensaio utilizado para controle de qualidade, enquanto o perfil de dissolução é apropriado para o desenvolvimento de formulações. Perfil de dissolução com meios farmacopeicos não tem como objetivo prever biodisponibilidade. Ou seja, não existe uma relação científica entre o desempenho de um medicamento no teste de perfil de dissolução e o comportamento que esse produto apresentará no organismo humano. A reportagem fez, portanto, afirmações completamente desprovidas de base técnica e científica. Todas as informações relativas às metodologias foram previamente prestadas pela Anvisa à reportagem. Porém, por motivos que desconhecemos, não foram utilizadas na matéria.
5.2 – Os medicamentos genéricos à base de losartana das empresas Medley, Geolab e Pratti apresentaram à Anvisa, no momento do seu pedido de registro, testes de bioequivalência satisfatórios. Portanto, são considerados equivalentes ao medicamento de referência;
6 – Diferente do que afirma a reportagem do Fantástico, a Anvisa não foi questionada sobre quantos laboratórios utilizaram metodologias próprias no registro do medicamento losartana potássica. A reportagem perguntou quais eram as metodologias específicas usadas nos registos de cada uma das losartanas potássicas analisadas pelo CEDAFAR. A Agência informou que as metodologias não famacopeicas desenvolvidas pelos fabricantes – e que foram analisadas e aprovadas durante o processo de registro – são disponibilizadas para os laboratórios oficiais quando estes realizam análise fiscal.
7 – As normas técnicas estabelecidas pela Anvisa baseiam-se sempre nas melhores evidências técnicas e cientificas disponíveis e nas melhores práticas internacionais. Dos comitês técnicos e grupos de trabalho que auxiliam a Agência na elaboração dessas normas, participam os melhores profissionais brasileiros de diversas áreas, assegurando-se sempre a ausência de qualquer conflito de interesse e a pluradidade. Assim, não há base nenhuma para a afirmação do Fantástico de que haja “divergências” entre a Agência e especialistas.
8 – A Anvisa realiza o monitoramento permanente da qualidade dos medicamentos comercializados no Brasil. Em 2016, a Agência suspendeu a comercialização de 95 diferentes lotes de medicamentos com suspeitas de desvios de qualidade. Essa ação decorre tanto de inspeções de rotina em fábricas de medicamentos como em razão de queixas apresentadas por pacientes ou profissionais de saúde sobre suspeita de ineficácia de um determinado medicamento ou reações adversas não previstas;
9 – A Agência não recebeu nenhuma queixa de desvio de qualidade dos lotes dos medicamentos que foram “testados” no laboratório contratado pelo Fantástico e relacionados com possível ineficácia;
10 – Para assegurar a qualidade dos medicamentos em uso no Brasil, sejam genéricos ou de referência, a Agência desenvolve um conjunto de ações complementares que incluem: a certificação da qualidade dos produtores; a análise dos registros e modificações de pós-registro; as ações de farmacovigilância; as inspeções nos fabricantes; e um programa de monitoramento da qualidade, chamado Proveme. Em 2016, 70% das amostras analisadas no âmbito desse Programa foram de medicamentos genéricos. Nenhuma dessas amostras foi considerada insatisfatória; e
11 – O consumo de medicamentos genéricos é seguro, assim como os de medicamentos de referência. É absolutamente equivocada, e perigosa para a saúde da população, a afirmação feita pela matéria de que caberia aos médicos indicar a cada paciente qual o genérico que tem qualidade. Os médicos não dispõem de meios para fazer tal afirmação. No mundo desenvolvido, são as agências regulatórias que estabelecem as normas para assegurar a qualidade, segurança e eficácia dos medicamentos. Opiniões individuais, sem qualquer base científica, podem ensejar orientações equivocadas, baseadas em preconceitos, em desinformação ou até mesmo em interesses comercias escusos. Nesse sentido, a matéria presta um desserviço à população ao fornecer informações incompletas e não oficiais sobre a qualidade de medicamentos.
12 – A Anvisa desenvolve, de forma contínua, esse conjunto de ações para garantir a qualidade, segurança e eficácia de todos os medicamentos produzidos em nosso país, sempre em convergência com as melhores práticas internacionais.